Eles já são 2 800 combatendo no Iraque e no Afeganistão.
Saltam de paraquedas, usam visor noturno
e têm cemitério de honra
Oitenta por cento dos candidatos a integrar a unidade de elite mais renomada da Marinha americana, o Seal (sigla para Sea-Air-Land Team, criado por John F. Kennedy em 1962), não aguentam a chamada “semana dos infernos”. Ao longo de cinco dias e meio de corridas sem pausa, natação em águas gélidas e avanços rolando na lama, os recrutas têm direito a um total de apenas quatro horas de sono. Seguem-se anos e mais anos de treinamentos e ações em campo.
Os comandos Seal são numerados de um a cinco e de sete a dez. A equipe de número 6, considerada a elite da elite, é a mais secreta e cobiçada. Somente ela passa pelo teste adicional de saltar de paraquedas de uma altura de 10 mil metros, com máscaras de oxigênio, para dominar um navio sequestrado em alto-mar. Segundo relato do New York Times, apenas metade dos Seals que chegam a essa fase consegue passar na prova.
A rotina dos recrutas de quatro patas que integram as unidades de elite também não é para qualquer raça. Vão longe os tempos em que os primeiros cães introduzidos nas fileiras militares americanas eram doados ou comprados de seus donos civis, como em 1942, durante a Segunda Guerra.
Hoje, cães de guerra são criados e treinados por profissionais das Forças Armadas, ou então por serviços mercenários do ramo. Segundo a revista especializada Airman Magazine, a maior parte do contingente atual recebe formação na Base da Força Aérea de Lackland, em San Antonio, no Texas. A meta é produzir pelo menos 100 filhotes a cada ano.
Para ascender ao panteão dos cães de elite, os filhotes começam a ser avaliados já no terceiro dia de vida, através de reflexos e respostas para exercícios de estímulo neurológico. Os exercícios biossensoriais se destinam, conforme o manual de treinamento, a “melhorar o desempenho cardiovascular e aumentar a resistência do animal a estresse e diminuir sua vulnerabilidade imunológica”.
Decorridas as oito semanas de avaliação inicial, o filhote considerado promissor para a carreira militar é encaminhado para seis meses de treinos intensivos, em mãos profissionais, fora da Base de Lackland. E só após esse semestre o quatro-patas é considerado apto a participar de treinos junto a um comando como o Seal.
Junto aos 79 homens que tomaram de assalto os céus de Abbottabad e encurralaram Osama bin Laden na noite de 1º de maio passado, havia um desses cães belicosos. De costas para o vácuo, o rabo em riste, corpanzil e focinho firmemente atrelados ao seu parceiro bípede, cão e homem foram ejetados do helicóptero Black Hawk para a mesma missão. Pelo menos no momento do salto rumo ao nada, o cachorro leva vantagem.
“Cães não percebem a diferença de altitude, incomodam-se muito mais com o ruído dos motores”, explicou, ao jornal londrino The Times, o ex-fuzileiro naval, e hoje criador de cães de guerra, Mike Dowling. “Uma vez em voo livre, sentem-se mais à vontade do que os recrutas. Aliás, um cão bem treinado está sempre feliz quando em companhia de seu treinador.”
Pal, primeiro canídeo a estrear como paraquedista ao lado do seu treinador Jesse Mendez, em 1969, durante a guerra do Vietnã, era um pastor alemão de 21 quilos e pelo negro. Portava óculos de aviador semelhantes aos de Mendez. Consta que se divertiu às pampas.
Já a incorporação de um cão da raça belga malinois (o nome deriva da cidade belga de Malinas) à operação mata-mata em Abbottabad seguiu uma estratégia mais definida para a região. “Em muitos países do Oriente Médio há uma aversão cultural pronunciada em relação a cães, e na região eles raramente são usados como animais de estimação”, explicou ao New York Times o major William Roberts, comandante do Centro de Treinamento de Cães do Departamento de Defesa americano. “Neste sentido, o seu poder de intimidação pode ser grande.”
De fato, segundo o Hadith, o escrito islâmico mais importante depois do Corão, a vida de um cachorro em países muçulmanos não deve ser moleza. Cães seriam impuros; os de cor preta devem ser eliminados; se algum cachorro lamber um vasilhame de uso humano, este precisa ser lavado sete vezes e escovado com areia uma oitava vez, e por aí vai. Assim, o deterrente psicológico do desembarque do cão Cairo no Q.G. de Bin Laden deve ter sido considerável.
Já são 2 800 os cães de guerra servindo no Iraque e Afeganistão, e este número só tende a aumentar, dada a eficácia de quadrúpedes, duas vezes mais velozes do que bípedes e dotados de uma combinação ideal de atributos afinados: olfato, resistência, velocidade, coragem, inteligência e capacidade de adaptação a qualquer condição climática.
Foi noticiada a compra, no ano passado, por 86 mil dólares, de quatro coletes táticos à prova d’água para o pelotão de cães dos Seals. Dotados de câmeras infravermelhas e de visão noturna, eles existem em duas cores (camuflagem e deserto) e são capazes de emitir imagens a quem estiver a 9 quilômetros de distância.
O investimento parece ser dos mais rentáveis – tanto em vidas quanto em dinheiro. Após gastar 19 bilhões de dólares ao longo de seis anos tentando desenvolver uma tecnologia de última geração para detectar bombas, o Pentágono admitiu em outubro do ano passado que a eficiência canina ainda era 30% superior à de aviões não tripulados e detectores aéreos.
Quando o presidente Barack Obama empreendeu seu giro asiático, no ano passado, uma unidade de elite de trinta cães farejadores fez parte da comitiva, hospedou-se em hotéis cinco estrelas e circulou a bordo de automóveis especialmente adaptados às suas necessidades. Dos assírios aos guerreiros da Idade Média, dos 6 mil cães usados pelos alemães já em 1915, para resgatar 4 mil soldados feridos, a utilização militar de cachorros dá saltos fenomenais. E para quem gosta de programas turísticos alternativos, o primeiro e mais antigo cemitério do mundo para cães de guerra fica a apenas trinta minutos de carro de Nova York, em Hartsdale.